O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para esta quinta-feira (2) a conclusão do julgamento que deve reduzir o alcance do foro privilegiado de deputados e senadores.

Dez dos 11 ministros da Corte já votaram em favor de enviar à primeira instância da Justiça processos criminais sobre delitos cometidos fora do mandato – 7 deles também querem tirar do STF as ações por crimes cometidos sem relação com o cargo.

O foro por prerrogativa de função, o chamado “foro privilegiado”, é o direito que têm, entre outras autoridades, presidente, ministros, senadores e deputados federais de serem julgados somente pelo Supremo.

O julgamento para discutir o assunto começou no ano passado e foi retomado nesta quarta com placar de 8 votos favoráveis à restrição do foro. Nesta quinta, também votaram pela limitação os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski. Na sessão desta quinta-feira (3), o último a votar será o ministro Gilmar Mendes.

Até o momento, entre os 10 ministros, 7 votaram conforme a proposta de Luís Roberto Barroso, para restringir o foro a crimes cometidos durante o mandato e relacionados às funções parlamentares.

Outros três votaram a favor da proposta do ministro Alexandre de Moraes, de deixar no STF qualquer tipo de crime cometido durante o mandato.

A proposta de Barroso estabelece ainda que o processo não mudará mais de instância quando se alcançar o final da instrução processual – última fase antes do julgamento de uma ação, quando as partes apresentam as alegações finais.

Assim, se um político que responda a processo no STF (por ter cometido o crime no cargo e em razão dele) deixar o mandato após a instrução, por qualquer motivo, ele deverá necessariamente ser julgado pela própria Corte, para não atrasar o processo com o envio à primeira instância.

Dias Toffoli

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (2), em favor da restrição do foro por prerrogativa de função (o chamado “foro privilegiado”) de deputados e senadores a crimes praticados durante o mandato – ações sobre delitos anteriores seriam enviadas à primeira instância.

Toffoli aderiu à proposta apresentada em novembro pelo ministro Alexandre de Moraes, também favorável à restrição do foro, direito que têm, entre outras autoridades, presidente, ministros, senadores e deputados federais de serem julgados somente pelo Supremo.

Além deles, já votaram por limitar o foro outros 7 ministros, mas de forma mais ampla, de modo a retirar do STF não só processos sobre casos ocorridos fora do mandato, mas também aqueles sobre delitos sem relação com o cargo – proposta do ministro Luís Roberto Barroso.

Toffoli optou pela fórmula de Moraes por fixar um parâmetro “objetivo” e “preciso” para a definição da competência para julgar o processo. Para o ministro, se o STF também derrubasse o foro para delitos cometidos sem relação com o mandato (mesmo durante seu exercício), essa ligação poderia ser objeto de interpretação, dando margem a subjetividade para a definição.

“A conjugação dos critérios exercício do mandato e em razão da função exigirá que esta Corte continue a se pronunciar, caso a caso, se o crime tem ou não relação com o mandato. E essa análise terá que ser feita pelo próprio STF, a quem compete definir se o processo permanece no Tribunal ou desce para a primeira instância, o que certamente paralisará investigações em curso e, o pior, poderá gerar nulidades em investigações e processos já iniciados”, disse.

Durante seu voto, o ministro defendeu o foro privilegiado, mas, ao reconhecer que já havia maioria para restringir esse direito, aderiu à posição dos demais. Antes, lembrou que o instituto foi criado para evitar pressão dos políticos sobre os juízes locais de primeira instância.

“Sou favorável às regras de prerrogativa de foro pois entendo que em uma federação complexa e marcadamente desigual como a brasileira, quem deve julgar as autoridades máximas do país não deve ser o poder local nem as elites policiais, ministeriais e judiciais. No caso, juízes de primeira instância, mas sim, um órgão da nação brasileira”, disse.

“A Constituição escolheu soberanamente, no processo constituinte, esta Corte, o Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do judiciário do país, para desempenhar esse mister”, completou em seguida.

O ministro acrescentou que o foro não tem como objetivo favorecer os políticos, mas garantir a “independência” da atuação deles e evitar “manipulações politicas nos seus julgamentos e subversão da hierarquia”.

Toffoli ainda rebateu a ideia de que os julgamentos no STF levam à impunidade. Lembrou que, em 2012, no julgamento do mensalão do PT, houve “clamor” contra o desmembramento do processo e envio para a primeira instância de réus sem o foro privilegiado.

“Não se trata de privilégio. Pelo contrário, aquele que tem a prerrogativa tem diminuída a instancia recursal”, disse, em referência à tramitação da ação num único tribunal, o próprio STF.

Além de Toffoli, faltam ainda votar os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Até o final do julgamento, os demais ministros que já votaram podem mudar de posição – o que raramente ocorre em decisões da Corte.

Ricardo Lewandowski

O ministro Ricardo Lewandowski também votou em favor da restrição do foro privilegiado para parlamentares nos moldes propostos por Moraes. Para ele, a fórmula conserva a garantia concedida aos deputados e senadores pela Constituição.

“Esta solução protege o parlamentar contra ação de natureza temerária que possa eventualmente tisnar ou dificultar o pleno exercício do mandato”, disse o ministro.

Assim como Toffoli, que votou antes, Lewandowski disse que o foro não é “privilégio”, mas uma “garantia” para os parlamentares, para terem julgamento independente.

“A ação penal de competência do STF não difere quanto ao rigor das demais ações penais em curso em todo o território nacional. A única diferença é que a competência é fixada por expresso comando constitucional”, afirmou o ministro.

Além disso, no início do voto, argumentou que uma mudança dessa regra não poderia ser feita pelo STF por meio de uma “questão de ordem”, instrumento usado pelo ministro Luís Roberto Barroso para propor a restrição do foro.

Por meio da questão de ordem, um ministro pode submeter ao plenário um problema num processo de sua relatoria para discutir uma solução com os colegas. Para Lewandowski, é um meio de “modestíssimo alcance”, impróprio para mudar as regras do foro privilegiado.

Como votaram os demais ministros

O julgamento para discutir o assunto começou no ano passado e foi retomado nesta quarta com o placar de 8 votos favoráveis à restrição do foro. Prevaleceu a tese defendida pelo ministro Luís Roberto Barroso.

Saiba como se posicionaram os ministros que votaram anteriormente:

Luís Roberto Barroso – Em seu voto, em maio do ano passado, o ministro Luís Roberto Barroso disse que a atual regra leva muitos processos à prescrição – quando a demora no julgamento extingue a punição – porque cada vez que um político muda de cargo, o processo migra de tribunal, atrasando sua conclusão. “A prática atual não realiza adequadamente princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e república, por impedir, em grande número de casos, a responsabilização de agentes públicos por crimes de naturezas diversas. Além disso, a falta de efetividade mínima do sistema penal, nesses casos, frustra valores constitucionais importantes, como a probidade e a moralidade administrativa”, disse no voto.

Alexandre de Moraes – Em novembro, quando o julgamento foi retomado, Alexandre de Moraes, primeiro a votar na sessão, reconheceu a “disfuncionalidade” da atual regra, por gerar um “sobe e desce” de processos pelas sucessivas mudanças de instâncias, levando ao risco da prescrição. O ministro defendeu que permaneçam no STF somente os processos sobre crimes cometidos durante o mandato, mesmo que não tenham relação com o cargo. Para ele, uma restrição mais abrangente, como propôs Barroso, dependeria de uma alteração na Constituição pelo Congresso. “O juízo natural dos congressistas que pratiquem infrações penais comuns – todos os tipos de infração independentemente de estarem ou não ligadas à função –, é o Supremo Tribunal Federal […] A finalidade protetiva do foro é possibilitar que do momento em que eles foram diplomados até o momento em que acabou o mandato, eles não sofram perseguições”, disse.

Luiz Fux – Acompanhou a proposta de Barroso, para tirar do STF também ações sobre delitos cometidos durante o mandato, mas sem relação com o cargo. “Ora o candidato exerce um cargo, ora exerce outro. Quando o processo baixa, ele não anda. Se ele baixa e não anda, quando ele voltar já está prescrito. Então é preciso que efetivamente que ele tenha um juízo próprio e que o Supremo seja reservado somente para os ilícitos praticados no cargo e em razão dele”, afirmou.

Edson Fachin – Relator dos processos da Operação Lava Jato, Edson Fachin argumentou que o foro privilegiado deve valer para atos ligados ao mandato parlamentar, que se destina à elaboração de leis, fiscalização dos outros poderes e debate de ideais. “O próprio Supremo Tribunal Federal tem admitido que a regra de imunidade não é absoluta devendo relacionar-se ao estrito desempenho das funções típicas do Congresso Nacional”, afirmou.

Celso de Mello – Mais antigo integrante do STF, Celso de Mello também defendeu a restrição, argumentando que os juízes de primeira instância são capazes de julgar deputados e senadores. “Eu pessoalmente atuei durante 20 anos como membro do ministério Público perante magistrados de primeira instância e posso atestar a seriedade, a responsabilidade, a independência com que esses agentes públicos atuam”, disse.

Cármen Lúcia – A presidente da Corte, Cármen Lúcia, que votou em junho pela restrição do foro, criticou “manobras” que políticos fazem para mudar de tribunal. “Nós chegamos aqui à situação em que um deputado renunciou para que nós não pudéssemos julgar, mas não dá mais para o Supremo ficar permitindo manobra que impeça que o julgamento aconteça. Eu, como cidadã me sinto e todo brasileiro se sente numa sociedade em que impunidade prevalece em razão de situações como essa”, disse.

Marco Aurélio Mello – Ainda em junho, Marco Aurélio Mello também defendeu o foro só para crimes ligados ao cargo. “Se digo que a competência é funcional, a fixação, sob o ângulo definitivo, ocorre considerado o cargo ocupado quando da prática delituosa, quando do crime, e aí, evidentemente, há de haver o nexo de causalidade, consideradas as atribuições do cargo e o desvio verificado”, afirmou.

Rosa Weber – A ministra defendeu o mesmo critério, lembrando que o foro foi se ampliando a cada nova Constituição. “O instituto do foro especial, pelo qual não tenho a menor simpatia, mas que se encontra albergado na nossa Constituição, só encontra razão de ser na proteção à dignidade do cargo, e não à pessoa que o titulariza”, disse.

FONTE: G1

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